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31 de maio de 2015

Livro de água

Claude Monet, Nenúfares

Fecho as páginas da noite. E
um livro de luz fica-me nas mãos,
queimando-me os dedos e os olhos
com o seu quente fulgor.

Ponho esse livro numa estante
lacustre. As suas folhas cobrem rãs
e nenúfares; e a música da água
inunda-o, apagando o seu fogo.

Ninguém sabe o que está nesse
livro; que obscuras frases o enchem
de inquietação; que luminosas
conclusões o libertam de sombra.

Ilustração de Ančka Gošnik Godec

Busco o enigma do seu título
- exíguo retrato de um rosto
passado, em cuo rasto me perco,
engano de rumo nas entranhas

do nome.

                
                                   Nuno Júdice, in O fruto da gramática, D. Quixote, 2015, 2ª ed., p. 91