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31 de janeiro de 2015

Vento de primavera

Ilustração de Tititi


Vento de primavera na costa:

As lapas agarram-se às rochas.

As gaivotas agarram-se ao vento

(Masamitsu Ito, Haikus)

Afonso Cruz, in Enciclopédia da Estória Universal - Mar, Alfaguara, 2014, 1ª ed., p. 176

30 de janeiro de 2015

Búzios

Ilustração de Redmer Hoekstra



Encosto o ouvido ao mar para ouvir o barulho dos búzios.

(Piotr Korzhev)

Afonso Cruz, in Enciclopédia da Estória Universal - Mar, Alfaguara, 2014, 1ª ed., p. 77


29 de janeiro de 2015

Vida

Ilustração de Bobby Chiu

A coisa mais difícil de navegar é a vida.
Não é o mar.

(Malgorzata Zajac)


Afonso Cruz, in Enciclopédia da Estória Universal - Mar, Alfaguara, 2014, 1ª ed., p. 177

27 de janeiro de 2015

É muito difícil para elas, para as palavras...

7 Ando pela casa em silêncio, porque as palavras, com a tristeza, ficam sozinhas, a deambular pela nossa cabeça, perdidas, sem saber para onde ir, as palavras emagrecem, definham, já não sabem o que significam, a palavra exultar pode transformar-se na palavra unhas, a palavra vida pode transformar-se na palavra rato, a palavra riqueza pode transformar-se na palavra sobras, a palavra felicidade pode transformar-se na palavra longe, a palavra infelicidade pode transformar-se na palavra costume. 

Ilustração de John Lendis

8 É muito difícil para elas, para as palavras, quando há muita aflição e ranger de dentes.

Afonso Cruz, in Enciclopédia da Estória Universal - Mar, Alfaguara, 2014, 1ª ed., p. 22

26 de janeiro de 2015

Velhos livros e ninguém

Era uma porta estreita, ao lado de uma montra onde se amontoavam livros em segunda mão, numa grande desordem. Do outro lado uma sala comprida e escura, enormes prateleiras que cobriam inteiramente as paredes. Velhos livros e ninguém. Nunca vira uma pessoa lá dentro. Cliente ou empregado. Aquela porta aberta, a penumbra da sala, de que não se via o fundo, lembravam vagamente uma armadilha.

Ilustração de Santiago Caruso
        
                Ana Teresa Pereira, "A rapariga da Pont Neuf", in As velas da noite, Relógio d'Água, 2014, p. 35

25 de janeiro de 2015

A livraria do Pont Neuf

Ilustração de Wonil Suh


Àquela hora havia uma ou outra espelunca ainda aberta, o que não tinha nada de surpreendente. O que a intrigava era a livraria, a porta enigmaticamente aberta da livraria.

Ana Teresa Pereira, "A rapariga da Pont Neuf", in As velas da noite, Relógio d'Água, 2014, p. 35

24 de janeiro de 2015

As velas da noite II

Ilustração de Pinwheel Bunny


A certa altura levantou-se e aproximou-se do quadro. A casa tornara-se ainda mais acolhedora, todos nós precisamos de um lugar tranquilo. Puxou uma cadeira e subiu para ela, levando consigo o candeeiro. Aproximou-o o mais possível do quadro. Sim, aqueles pontos mais claros eram estrelas. Havia mesmo estrelas no lugar onde ele estava. As abençoadas velas da noite.


Ana Teresa Pereira, "As velas da noite", in As velas da noite, Relógio d'Água, 2014, p. 54

As velas da noite I

Ilustração de Pinwheel Bunny 



E não há estrelas? perguntara Emma.
Sim, há estrelas.
As velas da noite.
O motivo por que as sete estrelas não são mais do que sete...Porque não são oito.

Ana Teresa Pereira, "As velas da noite", in As velas da noite, Relógio d'Água, 2014, p. 52

23 de janeiro de 2015

Um pouco como dançar...



Ilustração de Sonia MariaLuce Possentini


Um pouco como dançar, um pouco como fazer de conta...isso era representar. 


Ana Teresa Pereira, "If I should wake before I die", in As velas da noite, Relógio d'Água, 2014, p. 43

22 de janeiro de 2015

Dança...

Ilustração de Yao Xiong -Y. Nana


Não era difícil acreditar em contos de fadas. Cathy estava habituada a um palco, desde os cinco anos que estudava Dança, e o palco agora era uma velha casa, um longo jardim, um lago de águas imóveis. Antes de ela aparecer no filme, via-se o seu reflexo na água. E quase no final dançava sozinha no pavilhão junto ao lago, ao som da melodia da caixa de música, Oh, Willow Waly.



Ana Teresa Pereira, "If I should wake before I die", in As velas da noite, Relógio d'Água, 2014, p. 43

21 de janeiro de 2015

Uma biblioteca é um labirinto







Uma biblioteca é um labirinto. Não é a primeira vez que me perco numa.



Afonso Cruz, in Os livros que devoraram o meu pai, Caminho, 2010, p. 27

19 de janeiro de 2015

O mundo e o amor


Ilustração de Saré Evgenia



O mundo inteiro puxa-nos para baixo, mas as mãos de quem gosta de nós atiram-nos para o alto. Sem se cansarem.



Afonso Cruz, in O pintor debaixo do lava-loiças, Caminho, 2011, 1ª ed., p. 36

17 de janeiro de 2015

O estômago da cabeça

Ilustração de Sandrine Kao

- Há muitos tipos de comida - disse o coronel Möller enquanto abanava o filho. - Um homem possui três estômagos: um na barriga, outro no peito e outro na cabeça. O da barriga toda a gente sabe para que serve; o do peito mastiga a respiração, que é a nossa comida mais urgente. Uma pessoa morre sem ar muito mais depressa do que sem água e pão. 

Ilustração de Lirios Bou

E por fim há o estômago da cabeça, que se alimenta de palavras e de letras.

Afonso Cruz, in O pintor debaixo do lava-loiças, Caminho, 2011, 1ª ed., p. 20

14 de janeiro de 2015

Homero

Ilustração de Asako Eguchi


Escrever o poema como um boi lavra o campo 

Sem que tropece no metro o pensamento 


Sem que nada seja reduzido ou exilado 


Sem que nada separe o homem do vivido




                  Sophia de Mello Breyner Andresen, in O Búzio de Cós e Outros Poemas, Obra Poética, Caminho, 2011, 2ª ed., p. 815

11 de janeiro de 2015

Oásis

Ilustração de Richolly Rosazza


Penetraremos no palmar
A água será clara o leite doce
O calor será leve o linho branco e fresco
O silêncio estará nu – o canto
Da flauta será nítido no liso
Da penumbra


Lavaremos nossas mãos de desencontro e poeira


Sophia de Mello Breyner Andresen, in O nome das coisas Obra Poética, Caminho, 2011, 2ª ed., p. 643

Não te chamo para te conhecer

Ilustração de Jing Jing Tsong


Não te chamo para te conhecer      
Eu quero abrir os braços e sentir-te
       Como a vela de um barco sente o vento


Não te chamo para te conhecer 

Conheço tudo à força de não ser


Peço-te que venhas e me dês   

            Um pouco de ti mesmo onde eu habite


Sophia de Mello Breyner Andresen, "Poemas de um livro destruído", VIII, in No Tempo Dividido, Obra PoéticaCaminho, 2011, 2ª ed., p. 270 

10 de janeiro de 2015

Guitarra

Ilustração de Raija Nokkala



Na voz de oiro e de sombra da guitarra

Algo de mim a si próprio renuncia






Sophia de Mello Breyner Andresen, in Ilhas Obra Poética, Caminho, 2011, 2ª ed., p. 747

8 de janeiro de 2015

Senhor

Ilustração de Asako Eguchi

Senhor sempre te adiei

Embora sempre soubesse que me vias 

Quis ver o mundo em si e não em ti 

E embora nunca te negasse te apartei

                             1987


                              Sophia de Mello Breyner Andresen, in Ilhas Obra Poética, Caminho, 2011, 2ª ed., p. 753

7 de janeiro de 2015

Exílio

Ilustração de Сержантова Олеся
Exilámos os deuses e fomos

Exilados da nossa inteireza

Sophia de Mello Breyner Andresen, in O nome das coisas Obra Poética, Caminho, 2011, 2ª ed., p. 642

6 de janeiro de 2015

Os três reis do Oriente

Ilustração de Noemí Villamuza


E foi para seguir essa estrela que Gaspar abandonou o seu palácio.



 Sophia de Mello Breyner Andresen, "Os três reis do Oriente"in Contos Exemplares, Figueirinhas, 2006, 36ª ed., pp. 147-148

5 de janeiro de 2015

Palavra ou estrela?

ilustração de Eugen Sopko


Primeiro pareceu a Gaspar que a estrela era uma palavra, uma palavra de repente dita na muda atenção do céu. 


Mas depois o seu olhar habituou-se ao novo brilho e ele viu que era uma estrela, uma nova estrela, semelhante às outras, mas um pouco mais próxima e mais clara e que, muito devagar, deslizava para o Ocidente. 




Sophia de Mello Breyner Andresen, "Os três reis do Oriente"in Contos Exemplares, Figueirinhas, 2006, 36ª ed., pp. 147-148

4 de janeiro de 2015

Reis Magos

Ajoelhado no terraço Gaspar olhava o céu da noite. Olhava a alta e vasta abóbada nocturna, escura e luminosa, que simultaneamente mostrava e escondia.

Ilustração de Maarit Ailio

E disse: 


— Senhor, como estás longe e oculto e presente! Oiço apenas o ressoar do teu silêncio que avança para mim e a minha vida apenas toca a franja límpida da tua ausência. Fito em meu redor a solenidade das coisas como quem tenta decifrar uma escrita difícil. Mas és tu que me lês e me conheces. Faz que nada do meu ser se esconda. Chama à tua claridade a totalidade do meu ser para que o meu pensamento se torne transparente e possa escutar a palavra que desde sempre me dizes.



                        Sophia de Mello Breyner Andresen, "Os três reis do Oriente"in Contos Exemplares, Figueirinhas, 2006, 36ª ed., pp. 147-148

3 de janeiro de 2015

Noite

Ilustração de Friedrich Hechelmann


Noite. Noite em nossa roda. Noite aberta.
E encontramos um silêncio imenso,
Um silêncio perfeito que nos esperava desde sempre.
E uma solidão que era a nossa imagem,
E uma profunda esperança,
Como se a noite tremesse
De tocar a aurora.



Sophia de Mello Breyner Andresen, in Poemas Dispersos, Obra Poética, Caminho, 2011, 2ª ed., p. 856