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21 de janeiro de 2014

Tardávamos diante das palavras

Ilustração de autor desconhecido


Tardávamos diante das palavras, como se os olhos

fossem cegar sobre as páginas que não acabávamos

de ler só para fazer durar o engano, o livro, o tempo

de todas as leituras. Guardávamos silêncio



à cabeceira. E cruzávamos de noite os dedos

à procura da luz que emanasse de um seio, da onda

do cabelo sobre a orelha, dos ombros, da cintura,

do começo dos lábios. Normalmente, achávamos apenas

a sombra da roupa na curva dos joelhos, a penumbra

entre os nossos corpos quietos e deitados.


Ilustração de Evangelina Prieto

É nas linhas das mãos que os deuses escrevem

os mais belos romances. Nas nossas, porém, somente

elaboraram um divertimento, um esboço, um rascunho,

nem sequer literatura.


Maria do Rosário Pedreira, in Poesia Reunida, Quetzal poesia, 2012, 1ª ed., p. 63

Acordai!



Acordai
acordai
homens que dormis
a embalar a dor
dos silêncios vis
vinde no clamor
das almas viris
arrancar a flor
que dorme na raíz

Acordai
acordai
raios e tufões
que dormis no ar
e nas multidões
vinde incendiar
de astros e canções
as pedras do mar
o mundo e os corações

Acordai
acendei
de almas e de sóis
este mar sem cais
nem luz de faróis
e acordai depois
das lutas finais
os nossos heróis
que dormem nos covais
Acordai!

José Gomes Ferreira (letra)
Fernando Lopes Graça (música)
Coro Ricercare