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31 de julho de 2012

Se o vento vier

 
Ilustração de Noriko Senshu



De repente, sem saber por onde entrara, eu tinha a lua comigo. Não era a primeira vez, não, não era. A primeira vez havia sido há muitos anos: adormecera na eira sobre o feno, e quando acordei a lua estava a meu lado e fizera da noite um interminável e azul lago de prata. Eu flutuava no luar espesso, pesava menos que uma folha de papel. Todo o esforço que fazia era para não me desprender do solo, como se a acção da gravidade não me dissesse respeito, e flutuar no espaço fosse a minha vocação. Se o vento vier, não tenho mais remédio que abandonar-me e ver até onde me levam os seus espíritos.

Eugénio de Andrade, in Vertentes do olhar

30 de julho de 2012

Luar

Ilustração de Danguole Jokubaitiene



O luar enche a terra de miragens
E as coisas têm hoje uma alma virgem,
O vento acordou entre as folhagens
Uma vida secreta e fugitiva,
Feita de sombra e luz, terror e calma,
Que é o perfeito acorde da minha alma.



Sophia de Mello Breyner Andresen

29 de julho de 2012

Lua

Ilustração de Victor Nizovtsev



Entre a terra e os astros, flor intensa.

Nascida do silêncio, a lua cheia

Dá vertigens ao mar e azula a areia,

E a terra segue-a em êxtases suspensa.


Sophia de Mello Breyner Andresen

Pagar mais impostos é muito bom para quem paga mais impostos (2)

Ilustração de Juri Romanov


- A questão é simples: os impostos servem para melhorar a vida do país. Certo?
- Certo.
- Portanto...
- Portanto: quanto mais impostos um indivíduo pagar, mais o país melhora a sua qualidade de vida.
- Ou seja...
- Ou seja: quanto menos dinheiro cada pessoa tiver por mês para viver - pelo facto de pagar mais impostos - mais dinheiro tem o país, no geral.
No limite: quando alguém compra um pão com manteiga e o come, está, objectivamente, a roubar esse pão ao país.
- Exacto.
- Viva pois o país - exclamou o Primeiro Auxiliar.
O segundo concordou.
- A questão é: estamos ao serviço dos interesses do cidadão singular ou do país como um todo?
- Do país como um todo, Chefe! - gritaram, em uníssono, os Auxiliares.
E repetiram ainda, com os braços levantados:
- Como um todo! Como um todo!
- E o país pertence a todos! - insistiu o Primeiro Auxiliar.

- Exacto. A todos.
- Portanto, se o nosso objectivo patriótico é melhorar a qualidade de vida do país, o que temos a fazer é...
- Piorar a qualidade de vida de cada cidadão!
- Aí está!

                                                                              Gonçalo M. Tavares, in O Senhor Kraus

28 de julho de 2012

Pagar impostos é muito bom para quem paga mais impostos (1)

Ilustração de Jean-Baptiste Monge

-Trata-se no fundo...
- Exacto, Chefe. No fundo!
O chefe tossiu, estava a meio da frase - não era ainda o momento para interrupções servis.
- Trata-se no fundo - recomeçou, irritado, o Chefe - de um problema de crença, não de dinheiro.
- De crença, Chefe? - murmurou o Primeiro Auxiliar.
- Sim, de crença. Temos de passar a ideia de que os impostos são bons para a pessoa que paga impostos. Quanto mais pagar, melhor para ela. É nisto que ela tem de acreditar.
...
Gonçalo M. Tavares, in O Senhor Kraus

27 de julho de 2012

O Chefe que dava o exemplo

Ilustração de Juri Romanov

O Chefe gostava de dar o exemplo. Mas tirando isso não gostava de dar nada a ninguém.
Quando algum desgraçado se aproximava dizendo:
- Eu precisava de apoio para investir na minha empresa...
O Chefe ia logo com a frase:
- Olhe, por exemplo... - e lá continuava num longo discurso onde, de facto, exemplificava.
Quando o tal desgraçado voltava a casa, a mulher perguntava<.
- Então, o Chefe? Deu-te apoio?
E o homem respondia:
- Deu-me um exemplo.
(...)
Gonçalo M. Tavares, in O Senhor Kraus

As fontes

Ilustração de Vladimir Olenberg
Um dia quebrarei todas as pontes
Que ligam o meu ser, vivo e total,
À agitação do mundo do irreal,
E calma subirei até às fontes.

Irei até às fontes onde mora
A plenitude, o límpido esplendor
Que me foi prometido em cada hora,
E na face incompleta do amor.

Irei beber a luz e o amanhecer,
Irei beber a voz dessa promessa
Que às vezes como um voo me atravessa,
E nela cumprirei todo o meu ser.


Sophia de Mello Breyner Andresen

26 de julho de 2012

Os avós

Ilustração de Courtney Autumn Martin

Entre os bacorinhos acabados de nascer aparecia de vez em quando um ou outro mais débil que inevitavelmente sofreria com o frio da noite, sobretudo se era Inverno, que poderia ser-lhe fatal. No entanto, que eu saiba, nenhum desses animais morreu. Todas as noites, meu avô e minha avó iam buscar às pocilgas os três ou quatro bácoros mais fracos, limpavam-lhes as patas e deitavam-nos na própria cama. Aí dormiriam juntos, as mesmas mantas e os mesmos lençóis que cobririam os humanos cobririam também os animais, minha avó num lado da cama, meu avô no outro, e, entre eles, três ou quatro bacorinhos  que certamente julgariam estar no reino dos céus...

José Saramago, in As pequenas memórias

Eis-me

Ilustração de Cecilia Pucci
 
Eis-me
Tendo-me despido de todos os meus mantos
Tendo-me separado de adivinhos mágicos e deuses
Para ficar sozinha ante o silêncio
Ante o silêncio e o esplendor da tua face

Mas tu és de todos os ausentes o ausente
Nem o teu ombro me apoia nem a tua mão me toca
O meu coração desce as escadas do tempo em que não moras
E o teu encontro
São planícies e planícies de silêncio

Escura é a noite
Escura e transparente
Mas o teu rosto está para além do tempo opaco
E eu não habito os jardins do teu silêncio
Porque tu és de todos os ausentes o ausente

Sophia de Mello Breyner Andresen, in Livro Sexto 

25 de julho de 2012

A ordem alfabética

Ilustração de Yuri Romanov

... não percebia bem por que motivo, sendo a enciclopédia um modelo de organização, a realidade não se ajustava sempre à ordem alfabética. O um, por exemplo, vinha antes do dois, embora o u fosse uma das últimas letras do abecedário. Além disso, tomávamos o pequeno-almoço antes de lancharmos e lanchávamos antes de jantar, quando numa progressão alfabética deveríamos começar o dia com o jantar para continuarmos com o lanche e acabar a jornada com um bom pequeno-almoço. Esta falta de acerto permanente entre o mundo enciclopédico e a existência real foi uma das preocupações mais gritantes da minha infância.


Juan José Millás, in A Ordem Alfabética

23 de julho de 2012

O lado da vida ou da peúga



Ilustração de Lisa Nanni invertida
Quis perceber o que estava a acontecer, mas só me ocorreu a ideia de que alguém voltara a realidade do avesso, como se faz a uma peúga, e que agora vivíamos no lado de fora, o mais luminoso, sem ter por isso deixado de existir no de dentro, que era onde eu tinha febre... (...)

Ilustração de Lisa Nanni
Compreendi, por fim, que as coisas aconteciam ao mesmo tempo de um lado e do outro da vida, mas que nem toda a gente tinha o privilégio de se aperceber disso, pelo que senti uma enorme gratidão por ter acordado naquele dia com essa vantagem em relação aos outros.

 Juan José Millás, in A Ordem Alfabética

22 de julho de 2012

Licor de tangerina

Ilustração de Liz Milkau

A madrinha tinha o segredo do equilíbrio dos licores, que tratava como se fosse vida, com instrumentos preciosos, no laboratório da sua cozinha secreta.

O licor servia-se às sextas-feiras, depois do jantar com bolo de laranja. Assim, aprendi que a vida se serve quente ou fria, em banho-maria, com as suas caldas e essências para beber devagar em pequenos copos de vidro.


Ana Paula Tavares, "Licor de tangerina" in Dizes-me coisas amargas como os frutos

Amargos como os frutos



Ilustração de Rosie Sanders

"Dizes-me coisas tão amargas
como os frutos..."

                                                               Kwanyama


Amado, por que voltas 
com a morte nos olhos
e sem sandálias
como se um outro te habitasse
num tempo
para além
do tempo todo

(...)
Ilustração de Rosie Sanders

 Amado, meu amado,
o que regressou de ti
é a tua sombra
dividida ao meio
é um antes de ti
as falas amargas
como os frutos

Ana Paula Tavares, in Dizes-me coisas amargas como os frutos




20 de julho de 2012

O interior da normalidade


Incapazes de outra coisa, ficámos a olhar por instantes um para o outro, até que Laura, por fim, se levantou, veio ao meu encontro e começámos a andar sem jeito rua abaixo. 
 
 
Tive a impressão de que qualquer coisa de anormal estava a acontecer no interior da normalidade, como quando nos encontramos num quarto com as luzes deslocadas dos lugares habituais, ou sentimos algo estranho no outro sem sermos capazes de reparar que leva o casaco de malha do avesso. Eu estava instalado no avesso da realidade e, por isso, percebia as suas costuras e conhecia os mecanismos através dos quais umas peças estavam cosidas às outras. Portanto soube logo que iria beijar Laura, o que, no outro lado do casaco, não teria sido capaz de fazer nem em mil anos de existência.

Ilustrações de Danguole Jokubaitiene

Sabia, além disso, que ela estava à espera, o que não impediu que os joelhos me fraquejassem, que me engasgasse ao tentar falar ou que as mãos me começassem a transpirar precisamente no momento em que decidi pegar numa das suas, que também estava molhada de suor.
Juan José Millás, in A Ordem Alfabética

A mãe


Ilustração de Daniela Giatarrana

A mãe chegou
não estava sozinha
o cesto que trazia
não estava bem acabado
a mãe chegou
não tinha as tranças direitas
a mãe chegou e o pano que trazia
não estava bem alinhado
a mãe chegou com olhos maduros
os olhos da mãe
não olhavam na mesma direcção
a mãe chegou
e não era ainda o tempo
do pão do leite azedo
e das crianças.
A mãe chegou e a fala que trazia
Não estava bem preparada
a mãe chegou
sozinha
com as falas da desgraça da miséria do leite fermentado e do barulho.

Ana Paula Tavares, in Dizes-me coisas amargas como os frutos

18 de julho de 2012

Em dois sítios ao mesmo tempo

Ilustração de Teresa Ramos


Claro que não era a primeira vez que estava em dois sítios ao mesmo tempo. Na escola, durante as aulas, costumava perder-me em sonhos que não mantinham qualquer relação com o que acontecia no quadro preto. E em casa também. A verdade é que era dado a extraviar-me no interior das fantasias como o meu pai entre as páginas da enciclopédia. Mas nunca um lugar imaginário tivera o grau de existência daquele em que os livros voavam.

Juan José Millás, in A Ordem Alfabética

16 de julho de 2012

O avô

Ilustração de Robert Dunn
 O homem que se aproxima, vago entre as cordas de chuva, é o meu avô. Vem cansado, o velho. Arrasta consigo setenta anos de vida difícil, de sábio, calado, que só abre a boca para dizer o indispensável. Fala tão pouco que todos nos calamos para o ouvir quando no rosto se lhe acende algo como uma luz de aviso.


José Saramago, in As pequenas memórias

15 de julho de 2012

Escrever para ninguém

Ilustração de Gonçalo Viana

Quem escreve, escreve para ninguém. Ou pelo menos não diz, não quer, não sabe para quem escreve. É uma cadência. Cá está: a flauta secreta das palavras.

Manuel Alegre, " A Carta", in O Quadrado

14 de julho de 2012

As poucas palavras

Foi um dia, e outro dia, e outro ainda.
Ilustração de Elena Prikhodko
Só isso: o céu azul, a sombra lisa,
o livro aberto.
E algumas palavras. Poucas,
ditas como por acaso.

 
Eram contudo palavras de amor.
Não propriamente ditas,
antes adivinhadas. Ou só pressentidas.
Como folhas verdes de passagem.
Um verde, digamos, brilhante,
de laranjeiras.

 
Foi como se de repente chovesse:
as folhas, quero dizer, as palavras
brilharam. Não que fossem ditas,
mas eram de amor, embora só adivinhadas.
Por isso brilhavam. Como folhas
molhadas.
 
Eugénio de Andrade, in Os sulcos da sede

12 de julho de 2012

O essencial não se vê

Ilustração de António João Santos e João Rodrigues
- O mundo que vemos é um consenso - disse Sors. - A maioria é que diz como é o mundo. Se a maioria olhar para uma mesa e disser que é uma mesa, a minoria que acha que é outra coisa é internada. 


O processo é simples, basta ver, no mundo à nossa volta, coisas que outros não veem.


 Afonso Cruz, in O Pintor debaixo do lava-loiças

11 de julho de 2012

Salzburgo

Ilustração de Salome Starbuck


Essa música ou água
quando a água é álamo

essa música ou terra
quando a terra é barco

essa música ou chama
quando a chama é onda

essa música - eras tu
ou um pássaro na sombra?


Eugénio de Andrade, in Escrita da Terra

10 de julho de 2012

Arte

Ilustração de Carol Carter
A arte serve para ver o interior das coisas, disse Sors. Atravessar as paredes e mostrar aquilo que não se vê, o que está escondido.


Ilustração de Akzhana Abdalieva
Ilustração de Akzhana Abdalieva

A arte está no infinito, e uma pessoa tem de construir uma reta para chegar lá. Não se chega ao impensável aos esses. Isso é bom para gatos, bêbados e pessoas. Os artistas, os verdadeiros, vão a direito.






 Afonso Cruz, in O Pintor debaixo do lava-loiças

9 de julho de 2012

Evidência

Ilustração de Andrea Innocent


 Para mim é evidente: o amor aproxima as pessoas e ficamos todos do mesmo tamanho.

Afonso Cruz, in O Pintor debaixo do lava-loiças


8 de julho de 2012

Miragem


Tinha-a visto na varanda, fumando um
Ilustração de Marina
cigarro, olhando para sítio nenhum, e tão
imóvel que nem se dava pelo fumo que 
envolvia o seu rosto e a transformava
em aparição que, com o cair da tarde,
se materializava em sombra. Ainda
tentei adivinhar em que direcção seguiam
os seus olhos, mas de onde eu estava
só via o rosto num esboço de perfil,
como se o corpo estivesse inacabado
sobre um suporte de nuvem. Depois,
a varanda ficou vazia, quando acabou
o cigarro, e foi como se nunca tivesse
existido, com a noite a cobrir a fachada.


Nuno Júdice, "Situação", in Fórmulas de uma luz inexplicável

7 de julho de 2012

Águas de Pessoa e Óscar Wilde

Ilustração de Gabriel Pacheco
Ilustração de Sophie Casson
...só as frases de espírito nos

dão o espírito das águas, que o pessoa detestava

porque não consumia água, e o wilde também

porque não tomava banho...

Nuno Júdice, in "De profundis"

6 de julho de 2012

Dicção

Ilustração de Andrea Kalfas

Vou falar em português,
com cada vogal no seu lugar, dita
com toda a clareza,
uma de cada vez. Assim,
não comendo os és nem os is,
e pondo cada ó, aberto
ou fechado, dentro da sílaba
que lhe cabe, o português
fica com os pontos nos is,
para que o ouvido perceba
o que é dele,
e quem o escreva saiba
que a letra escrita
não vai ser letra morta
na boca
de quem lhe abra a porta.


Nuno Júdice, in A matéria do poema

5 de julho de 2012

A espuma do café

Ilustração de Moony Khoa Le










Quando penso na existência de deus,
preciso de um café. Porém, tal como,
ao encher a chávena, sei que o café existe
por baixo da espuma, mesmo que
o não veja, também devia acreditar
que, por trás das nuvens, existe o deus em que
não acredito porque não o consigo ver. E ao
ligar um argumento ao outro, começo a perceber que não
há qualquer razão para não acreditar em deus, tal
como não tenho nenhuma razão para não acreditar 
no café cujo calor sinto na chávena, quando a aperto
para me aquecer, enquanto a espuma se não desfaz. E
poderia se este o motivo por que, ao olhar para o céu,
devia ter a mesma sensação de quem só espera que
as nuvens passem para ver esse deus
que elas escondiam. No entanto,
a verdade que me impediu de voltar a acreditar
na existência de deus foi que tive de beber
o café já frio, depois do tempo em que esperei
que a espuma se desfizesse para acreditar
que havia café na chávena, e um deus
no céu.


Nuno Júdice, "Nova suma teológica", in Fórmulas de uma luz inexplicável

3 de julho de 2012

Mala de viagem

Começa por guardar um sonho dourado
pelo sol, por onde corra o vento mais quente; põe
sobre ele o silêncio que acompanha o desejo
dos amantes, limpando-o das sombras
do inverno; protege-os com a negra foice
do destino, de lâmina embainhada na geada
matinal, cujo brilho anuncia já o céu
Ilustração de Шлыков Геннадий- Gennady
do meio-dia. Esvazia o búzio da madrugada
do seu recheio de amor, para que se possa ouvir
o mar sem o eco nocturno dos porões. Por
cima, põe as conchas do oráculo de rosto
apagado pelo degelo das estrelas. Lembra-te
que a casa que vais deixar não pode ficar
fechada; e que a chave do sono ficou entre
os seios nus da memória. Só assim
terás um rumo, e de cada vez que chegares
a mala estará pronta para a viagem.

Nuno Júdice, in Fórmulas de uma luz inexplicável

2 de julho de 2012

Modelo ao ar livre

Ilustração de Quentin Gréban

Seguindo o sulco negro das consoantes
dos teus cabelos, desenho lentamente os traços do
teu rosto. O meu objectivo é recortá-lo do papel
e ver-te à transparência da página, limpando
de vogais as tuas faces. Ponho-te neste retrato
de olhos fechados, e colho dos teus lábios
as pétalas que caíram com as sílabas
do amor, para as voltar a pousar nas mãos
que me estendes. Depois, vou buscar a luz
que me falta ao fundo da tarde, e derramo-a
pelo teu corpo, vendo soltarem-se da tua pele
as gotas primaveris de um céu límpido
como a imagem que aqui vejo florescer.

 
Nuno Júdice, in Fórmulas de uma luz inexplicável

1 de julho de 2012

Na orla do mar

Ilustração de Maryse Proulx
                                                               

Na orla do mar,
no rumor do vento,
onde esteve a linha
pura do teu rosto
ou só pensamento
(e mora, secreto,
intenso, solar,
todo o meu desejo)
aí vou colher
a rosa e a palma
Onde a pedra é flor,
onde o corpo é alma. 

Eugénio de Andrade, in Até amanhã 

Sobre a casa

 




Não há senão a casa
à beira do crepúsculo
não há senão
a vereda quase triste das palavras.




Eugénio de Andrade, in Véspera da Água